Portal do Butantan

Butantan é pioneiro na conservação ex situ de serpentes, estratégia fundamental para preservação de espécies endêmicas

Instituto sediou oficina do ICMBio e contribuiu com avaliação de espécies prioritárias da herpetofauna para integrar possíveis programas de manutenção fora de ambiente natural


Publicado em: 05/06/2025

Reportagem: Natasha Pinelli
Imagens: André Ricoy, José Felipe Batista e Renato Rodrigues/Comunicação Butantan e Otávio Marques



O Instituto Butantan tem sido pioneiro na conservação ex situ de serpentes no Brasil, principalmente por meio de ações encabeçadas pelo Laboratório de Ecologia e Evolução (LEEv). Há mais de duas décadas, a instituição vem concentrando esforços em prol da preservação de diversas espécies insulares endêmicas – em especial a jararaca-ilhoa (Bothrops insularis), nativa da Ilha da Queimada Grande, que fica no litoral sul de São Paulo e é conhecida popularmente como “Ilha das Cobras”.

A manutenção de espécimes ex situ – ou seja, quando o animal é mantido fora de seu ambiente natural – tem se consolidado como uma importante estratégia para a conservação da biodiversidade brasileira nos últimos anos. A técnica consiste em oferecer um espaço controlado, seguro e o mais próximo possível do ecossistema onde vivem espécies que estão ameaçadas ou com sua população em declínio.
 

Espécime de Bothops insularis em seu ambiente natural, na Ilha da Queimada Grande (Foto: Otávio Marques)

 

Além de garantir a condução de pesquisas que geram conhecimento e recursos capazes de serem aplicados in situ, contribuindo assim para uma melhor gestão do habitat e um possível aumento da população do animal em questão, a conservação ex situ garante a preservação genética da espécie e auxilia possíveis práticas de reprodução em biotério – o que pode viabilizar casos de reintrodução na natureza diante de situações reais de extinção.


Uma história de longa data
Desde a década de 1920, com a descrição da B. insularis pelo herpetólogo Afrânio do Amaral (1894-1982), o Butantan encontra-se na vanguarda das pesquisas relacionadas à espécie. Em 2009, a organização deu os primeiros passos rumo à conservação ex situ da serpente ao coletar os primeiros espécimes para tal finalidade. 

“A B. insularis foi escolhida para esse trabalho de conservação não apenas por ser ‘criticamente ameaçada’, mas também por reunir um volume considerável de informações relacionadas à sua biologia e evolução, cruciais para o desenvolvimento de técnicas adequadas para sua manutenção fora do ambiente natural”, explica o pesquisador científico do LEEv Otávio Marques.

 

Recinto que será dedicado à conservação da jararaca-ilhoa nas novas instalações do LEEv (Foto: José Felipe Batista)

 

Somam-se a isso o apelo cultural da jararaca-ilhoa e o “boom” de produções científicas ocorrido naquela época – impulsionadas, principalmente, pela retomada das expedições à Queimada Grande –, o que resultou em conhecimentos inéditos sobre sua população, reprodução e hábitos na ilha.

Com a inauguração da nova sede do Laboratório de Ecologia e Evolução no início deste ano, o Instituto Butantan deu mais um importante salto na consolidação de seu programa de conservação ex situ da jararaca-ilhoa: considerado o primeiro criadouro científico com fins conservacionistas do Brasil, o espaço conta com um inovador viveiro de 250 metros quadrados que será totalmente dedicado à manutenção da espécie. Atualmente, a estrutura encontra-se em fase de finalização. 

 


Paulo Nico, diretor do LEEv, dá as boas-vindas aos participantes da oficina de avaliação do Plano Nacional de Conservação (Foto: Renato Rodrigues)

 

De olho no futuro
Na Semana Mundial do Meio Ambiente, o Butantan mais uma vez reforça sua posição de referência quando o assunto é preservação de serpentes ao sediar a Oficina de Avaliação do Plano de Ação Nacional para conservação da herpetofauna ameaçada de extinção da região sudeste do Brasil, realizada na última segunda e terça-feira (2 e 3/6).

O encontro foi coordenado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e contou com a participação presencial e virtual de mais de 30 especialistas de diferentes instituições, como Zoológico de São Paulo, Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual Paulista (UNESP), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), além do próprio Instituto.

“O Butantan é parceiro do ICMBio e estamos procurando estabelecer novas cooperações e fortalecer as já existentes no âmbito da conservação de animais. Para nós, é de extrema importância participar deste tipo de discussão e contribuir com as diretrizes do Plano Nacional de Conservação”, reforçou o pesquisador científico e diretor do Laboratório de Ecologia e Evolução, Paulo Nico Monteiro, durante a abertura do evento.

 

Parte do time de especialistas que participaram dos dois dias de oficina (Foto: André Ricoy)

 

De acordo com o veterinário e analista ambiental do ICMBio Carlos Abrahão, o objetivo da discussão foi elencar quais são as serpentes e lagartos ameaçados que precisam ser priorizados para possíveis programas de conservação ex situ, e identificar quais instituições estariam aptas a assumir tal missão. 

Para isso, os participantes responderam a 19 questionários – cada um dedicado a uma das espécies ameaçadas pré-selecionadas –, que reuniam cerca de 30 perguntas relacionadas ao risco de extinção do animal, assim como sua importância, distribuição, valor cultural, situação populacional e potenciais ameaças.

Espécies como a jararaca-ilhoa (B. insularis); a jararaca-de-alcatrazes (Bothrops alcatraz); a jararaca-de-vitória (Bothrops otavioi); a jiboia-do-ribeira (Corallus cropanii); a cobra-de-duas-cabeças (Amphisbaena nigricauda); e o calango-liso-da-restinga (Brasiliscincus caissara) foram algumas das avaliadas. 

“Ficamos muito honrados por receber esse evento aqui no Butantan e encabeçar um assunto tão relevante atualmente, junto com o ICMBio”, completou a bióloga e tecnologista do LEEv Karina Kasperoviczus, responsável por coordenar a ação no Instituto Butantan.

Até o final do ano, a expectativa do ICMBIo é realizar mais quatro oficinas similares com foco nas outras regiões do país e consolidar uma lista preliminar que ajudará a balizar futuros programas de conservação voltados à herpetofauna brasileira.