Portal do Butantan

Quando a vida imita a arte: 6 filmes clássicos da temporada de Natal nas versões “bichos da natureza”

Tem serpente que “esquece” as crias de propósito, ave que poderia pegar carona no Expresso Polar e até sapinho com decoração extravagante – igual alguns vizinhos fazem por aí


Publicado em: 23/12/2024

Reportagem: Natasha Pinelli
Arte das imagens: Guilherme Gomes/Comunicação Butantan
Fotos: Comunicação Butantan e Shutterstock


A época mais encantadora do ano chegou! É tempo de agradecer pelas conquistas do ano, confraternizar com a família e os amigos e presentear aqueles que amamos. É também tempo de ficar horas e horas ajudando a desenrolar luzinhas natalinas, convencendo a avó a não colocar uva passa no arroz e, claro, maratonando aqueles clássicos natalinos que todo mundo ama assistir enquanto espera o Papai Noel.

Com a ajuda dos especialistas do Museu Biológico do Parque da Ciência, o Portal do Butantan listou seis filmes de Natal que você provavelmente já assistiu, mas sob um ponto de vista diferente: como as histórias deles se relacionam com situações incríveis e divertidas do mundo animal. Ficou curioso? Então prepare-se para dar o play, aprender e se divertir!
 

 

1. Esqueceram de Mim (Home Alone, 1990)
Atire a primeira bolinha de árvore de Natal quem nunca sonhou em passar as festas de fim de ano no melhor estilo Kevin McCallister (Macaulay Culkin): sozinho em uma casa incrível, sem nenhum adulto fiscalizando o cardápio do jantar – composto, basicamente, por sorvete –, e vendo o que bem entendesse na televisão. Por mais que na ficção o garotinho de 8 anos tenha sido deixado para trás acidentalmente por sua família, na natureza diversas espécies “esquecem” de suas crias de propósito. 

Boa parte das serpentes ovíparas – que pertencem a espécies nas quais os filhotes se desenvolvem dentro de um ovo, caso da dormideira (Dipsas mikanii) e da cobra-cipó (Chironius exoletus) – nunca tiveram a oportunidade de conhecer suas “mamães”. Isso porque, depois da postura, as fêmeas abandonam o ninho à própria sorte. Assim como Kevin, que precisa aprender a fazer compras, lavar roupa e até defender sua residência de ladrões atrapalhados, as pequenas serpentes são lançadas em um mundo onde a sobrevivência depende exclusivamente de suas próprias habilidades desde cedo. 

 


 

2. O Grinch (How the Grinch Stole Christmas, 2000)
Se existe um bicho na natureza que concordaria com o Grinch (Jim Carrey), personagem rabugento que quer boicotar as festividades natalinas, seria a serpente caninana (Spilotes pullatus). A expressão de poucos amigos e a fama de bravo são comuns entre eles, assim como o corpinho alongado – ainda que o ser fantástico seja praticamente microscópico, pois vive dentro de um floco de neve, e a cobra possa alcançar 2,5 metros de comprimento. 

No filme, Grinch planeja invadir a casa das pessoas e roubar tudo que lembre o Natal para acabar de vez com a data. Já a caninana demonstra sua insatisfação inchando a região do pescoço, mostrando a língua e, por vezes, tentando morder aqueles que lhe incomodam. A grande verdade, porém, é que os dois são inofensivos: como não possui veneno, a caninana assusta, mas não faz mal a ninguém; assim como o personagem, que esconde seu bom coração por trás de uma personalidade ranzinza.

 


 

3. Milagre na Rua 34 (Miracle on 34th Street, 1994)
Com tantos sósias espalhados pelo mundo, o Papai Noel original já está acostumado a sentir o peso da dúvida quando o assunto é sua identidade. É isso que faz a pequena Susan (Mara Wilson), uma garotinha para lá de desconfiada, que afirma não acreditar na existência do Bom Velhinho. Na natureza, quem também é sempre colocada à prova, despertando desconfiança por onde passa, é a coral-verdadeira (Micrurus frontalis). 

Diferentemente do Papai Noel, a serpente é “copiada” por ser temida, uma vez que é uma das mais peçonhentas encontradas no Brasil – só nas Américas são mais de 50 tipos de falsa-coral, a maioria da família Dipsadidae. O corpo vermelho com padrões em preto (igual ao traje do velhinho, veja só!) serve como alerta para os outros animais. Mas apesar de perigosa, a realidade é que a coral-verdadeira é tímida e tranquila: gosta de se esconder na vegetação rasteira, em buracos e debaixo de pedras, raramente causando acidentes.

 


 

4. Um Natal Brilhante (Deck The Halls, 2006)
A engraçada rixa natalina encabeçada pelos vizinhos Steve Finch (Matthew Broderick) e Buddy Hall (Danny DeVito), que disputam o posto de casa mais decorada e iluminada do bairro, seria muito bem representada na natureza pelas espécies de sapo-arlequim (Atelopus). Brilhante e chamativo, o bicho pode ser encontrado em diversas cores: laranja, verde, amarelo, azul, roxo e até rosa – assim como os pisca-piscas de Natal!

Enquanto as famílias do filme lutam por atenção e reconhecimento por meio de decorações natalinas extravagantes, o visual empolado do sapo-arlequim tem como objetivo advertir possíveis predadores do veneno que possui. Mas, quando não está alerta, o animal pode fazer as vezes de Papai Noel e sumir: com o tamanho de um polegar de bebê, é difícil encontrá-lo nas florestas da região amazônica.

 


 

5. Um Herói de Brinquedo (Jingle All The Way, 1996)
Quem costuma deixar as compras de Natal para o último minuto conhece bem a angústia vivida pelo personagem Howard Langston (Arnold Schwarzenegger): em débito com o filho por uma série de motivos, o empresário se vê em uma enrascada para conseguir o presente solicitado pelo pequeno Jamie (Jake Lloyd). 

A dedicação do pai em conseguir o boneco mais disputado da temporada lembra até a persistência das fêmeas surucucu-pico-de-jaca (Lachesis muta) durante a incubação de seus ovos. Considerada uma das maiores serpentes peçonhentas das Américas, a espécie é uma das poucas que desempenha cuidado parental: ela chega a ficar enroladinha nos ovos por mais de 100 dias após a postura. Para se defender, a serpente tem o costume de vibrar e movimentar sua cauda rapidamente, chegando até a liberar uma explosão de fezes para repelir o inimigo – bem no estilo Pepe Le Gambá!

 


 

6. Expresso Polar (The Polar Express, 2004) 
A emocionante jornada do Expresso Polar – trem que parte na noite anterior ao Natal rumo ao Polo Norte, repleto de crianças ansiosas para conhecerem o Papai Noel – se conecta com a incrível migração da andorinha trinta-réis (Sterna paradisaea). A ave, que se reproduz no Ártico durante o verão, é conhecida por percorrer vastas distâncias. Com a chegada do outono no hemisfério Norte, ela viaja até 90 dias e cerca de 80 mil quilômetros até o outro extremo do planeta: a Antártida. Lá, aproveita, mais uma vez, a longa disponibilidade de luz do verão para se alimentar.

Assim como o trem, que realiza diversas escalas para embarcar os viajantes de diferentes partes do mundo, a ave também faz paradas estratégicas (inclusive em diversas praias do Brasil) a fim de recarregar suas energias e seguir rumo ao sul do planeta. Talvez o único motivo pelo qual o pássaro não pega carona no Expresso Polar é que as viagens do comboio mágico ocorrem durante o inverno do hemisfério Norte, período em que o animal já está bem longe dali.
 

Essa matéria contou com a contribuição e foi validada pela pesquisadora científica e diretora, Erika Hingst-Zaher, pelos tecnologistas em manejo animal Marcelo Stefano Bellini Lucas e Lucas Simões Lima, do educador Heitor Bissoli Silva e do monitor Bruno Schneider Caldeira, todos do Museu Biológico do Butantan.


Referências:

ATELOPUS SURVIVAL INITIATIVE. Sapos-arlequim
INSTITUTO BUTANTAN. Série Didática
PROCEEDINGS OF THE NATIONAL ACADEMY OF SCIENCES (PNAS). Tracking of Arctic terns Sterna paradisaea reveals longest animal migration