Celebrado em 28/6, o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIAPN+ relembra a revolta que aconteceu no bar Stonewall Inn, em Nova York, nos Estados Unidos, contra a violência e represálias que representantes da sigla vinham sofrendo das autoridades locais. O episódio, que ocorreu em 1969, marcou o início da luta da comunidade em um movimento organizado em prol da igualdade civil.
Para os cientistas apoiadores da causa, o chamado “mês do orgulho” ganha contornos ainda mais especiais uma vez que marca, também, o aniversário de Alan Turing. Nascido em 25 de junho de 1912, o matemático britânico, conhecido por desenvolver a base da computação moderna e decifrar códigos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), contribuindo para a vitória dos Aliados, é uma das figuras LGBT mais emblemáticas da ciência – campo em que a representatividade era escassa até pouco tempo.
Apesar de não existirem dados oficiais sobre a população LGBTQIAPN+ na ciência brasileira, a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) – Quesito Orientação Sexual, realizada em 2019 em caráter experimental, apontou que cerca de 2,9 milhões de pessoas se declararam homossexuais ou bissexuais no país, correspondendo a 1,8% dos brasileiros maiores de 18 anos. Uma vez que dados sobre identidade de gênero não foram coletados, acredita-se que a parcela seja ainda mais expressiva, com seus representantes ocupando e assumindo posições em todas as esferas da sociedade – como, por exemplo, dentro dos laboratórios.
“Não é que essas pessoas não existissem antes. O que acontece é que, hoje, os outros também tomam consciência delas”, observa o pós-doutorando no Laboratório de Toxinologia Aplicada (LETA) do Butantan Rodrigo Disner. Natural do interior de Santa Catarina, o pesquisador reflete sobre como a falta de representatividade impactou sua jornada. “O fato de eu ter crescido em um lugar onde não se tinha essas figuras talvez tenha feito com que eu levasse mais tempo para alcançar meu próprio entendimento”, observa.
O pós-doutorando Rodrigo Disner desenvolve pesquisas relacionadas à plataforma Zebrafish no Laboratório de Toxinologia Aplicada (LETA) do Butantan
O valor da diversidade e de um ambiente seguro
Segundo a pesquisa Diversity Matters: América Latina, da consultoria McKinsey & Company, empresas que abraçam a diversidade alcançam níveis mais altos de inovação, uma vez que seus colaboradores e colaboradoras se sentem mais à vontade para propor novas ideias e sugerir maneiras diferentes de fazer as coisas. “Um grupo mais diverso traz esses inputs, essas chegadas de ideias e informações novas que uma pessoa sozinha ou dentro de uma uniformidade de mundo só vai até certo ponto”, completa Rodrigo.
É por isso que, nos últimos tempos, o Instituto Butantan tem investido em diversas ações para tornar seu ambiente de trabalho cada vez mais plural e inclusivo – seja na atração de novos talentos, seja na conscientização de seu corpo de funcionários.
Vilaça Oliveira é estagiária no Laboratório de Ciclo Celular e, em breve, também vai iniciar um mestrado na área
“Não dá para trabalhar em um lugar onde a gente não pode existir, ser quem a gente realmente é”, pontua a estagiária do Laboratório de Ciclo Celular Vilaça Oliveira. No Butantan há três meses, a estudante se disse emocionada com o fato de que quase todos os integrantes do laboratório vieram lhe perguntar como ela gostaria de ser chamada. “Para a minha geração, uma forma de demonstrar respeito é tratar a pessoa com o pronome que ela julga ser o mais adequado. Eu, por exemplo, tenho preferência pelo feminino ela/dela, mas também atendo por ele/dele.”
Carô Luvisotto é arte-educador no Museu da Vacina do Butantan, facilitando a comunicação científica
Para o arte-educador do Museu da Vacina Carô Luvisotto, outra forma relevante de inclusão e respeito é o uso do chamado nome social – decreto que garante às pessoas trans a validade e legalidade dos nomes pelos quais elas reivindicam serem chamadas. “Nos próximos dias vou alterar meu nome. Corrigir o crachá que utilizo todos os dias aqui será algo muito importante”, afirma.
Como mediador e facilitador da comunicação com o público externo, Carô diz receber com naturalidade os questionamentos dos visitantes em relação à sua identidade de gênero e saber identificar aquelas trocas que valem a pena ser aprofundadas. “Muitas vezes ficamos com a sensação de não termos chegado em nenhum lugar, mas acredito que essas conversas se expandem, gerando pensamentos e questionamentos para além do espaço e do momento onde ocorreu.”
Ariana Bezerra de Andrade é supervisora do Controle da Qualidade Microbiológico e contribui para a excelência dos produtos desenvolvidos no Instituto
Entretanto, ampliar as possibilidades de identificação e naturalizar a presença LGBTQIAPN+ nas mais diversas esferas da sociedade não pode ser uma luta limitada aos representantes da sigla. “É de extrema importância para a comunidade que as pessoas cisgênero e heterossexuais demonstrem apoio à nossa causa, adotando posturas anti-homofóbicas e se posicionando para diminuir toda e qualquer ignorância”, defende a supervisora do Controle da Qualidade Microbiológico Ariana Bezerra de Andrade.
Passadas mais de cinco décadas após os primeiros levantes de Stonewall Inn, para Ariana, Rodrigo, Vilaça e Carô – assim como para muitos outros representantes e apoiadores da causa – ser LGBTQIAPN+ continua sendo um ato político.
Vamos ouvir mais sobre o assunto?
Não deixe de conferir o vídeo com os quatro representantes da comunidade. Dê o play e reflita sobre o que você pode fazer para ajudar a criar ambientes cada vez mais acolhedores e inclusivos.
Reportagem: Natasha Pinelli
Fotos e vídeo: Marília Ruberti/Comunicação Butantan
Identidade Visual: Thiago Lemos