O último dia da 25ª Assembleia Geral Anual da Rede de Fabricantes de Vacinas de Países em Desenvolvimento (DCVMN, na sigla em inglês), evento internacional sediado pelo Instituto Butantan e a Bio-Manguinhos/Fiocruz entre os dias 16 e 18/10 na cidade de São Paulo, abordou a necessidade de capacitação de novos profissionais, os impactos das mudanças climáticas na saúde, a sustentabilidade na produção de vacinas e novas formas de combater a hesitação vacinal, incluindo jogos eletrônicos para atrair o público jovem.
O diretor de Assuntos Regulatórios, Qualidade e Desenvolvimento Clínico do Butantan, Gustavo Mendes, participou da sessão Fortalecendo Capacidades: Programa de Desenvolvimento da Força de Trabalho em Vacinas, que teve como objetivo discutir os desafios na formação de profissionais para a indústria de países de baixa e média renda – um dos pilares para expandir capacidades de produção e promover a equidade de acesso aos imunizantes.
“O trabalho de uma indústria de biotecnologia é muito especializado e requer um conhecimento técnico muito aprimorado. E é um desafio, não só no Brasil como no mundo inteiro, saber como formar profissionais e retê-los”, afirmou o diretor.
Gustavo Mendes participou de uma sessão especial no DCVMN
No Brasil, Gustavo destacou o papel da Escola Superior do Instituto Butantan (ESIB) na integração entre estudantes e indústria. “Percebemos que o Butantan precisava de uma unidade especial de treinamento dentro de nosso complexo científico, e essa relação tem sido muito positiva. As novas tecnologias que vão surgindo vão demandar cada vez mais treinamento e expertises multiqualificadas”, disse.
Para atender a essas necessidades, o DCVMN tem trabalhado no desenvolvimento de programas de capacitação para os fabricantes-membros, com apoio da Fundação Bill & Melinda Gates e da PATH, organização internacional que trabalha para o acesso equitativo de vacinas. O Butantan faz parte dos Grupos de Trabalho da rede, que se reúnem para compartilhar melhores práticas e projetos em áreas como Assuntos Regulatórios, Farmacovigilância e Desenvolvimento Clínico.
Hesitação vacinal: estratégias de combate
Outro painel que foi destaque nesta sexta foi o Combater a Hesitação Vacinal e Construir Confiança, coordenado pela professora do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública da Universidade Federal de Goiás, Cristiana Toscano. A especialista convidou o público a refletir sobre questões como: qual faixa etária você acredita que manifesta maior hesitação em relação às vacinas? Quais são os impactos dessa desconfiança? Como mudar esse cenário?
De acordo com a fundadora do projeto Vaccine Confidence, Heidi Larson, professora da London School of Medicine and Hygiene & Tropical Medicine, a confiança nos imunizantes foi severamente impactada durante a pandemia de Covid-19, sendo o grupo etário mais atingido o de 18-35 anos. “Isso é muito preocupante considerando que são potenciais jovens pais e mães que deixam de vacinar suas crianças”, afirmou.
Heidi Larson falou sobre a pandemia da Covid-19
Dados de uma pesquisa global apresentados pela pesquisadora mostraram que, após a vacinação contra o SARS-CoV-2, 54% das pessoas disseram que tiveram dúvidas se queriam tomar a vacina, 72% afirmaram estar aliviados após a imunização e 26% se arrependeram de ter se vacinado. Deste último grupo, 33% tinha entre 18 e 34 anos.
Para incentivar a vacinação durante a pandemia, o Vaccine Confidence lançou a campanha Get Back to What You Love (Volte para aquilo que você ama, em português), em parceria com o YouTube. Os vídeos mostravam exemplos do que as pessoas poderiam voltar a fazer, com segurança, uma vez que estivessem imunizadas e protegidas – como abraçar familiares, comemorar aniversários, viajar com os amigos. “Acredito que temos que construir confiança nas vacinas com ações baseadas no senso de comunidade. Temos que construir esperança”, disse.
Já o CEO e fundador da empresa finlandesa Psyon Games, Olli Rundgren, apresentou uma nova forma de pensar a conscientização sobre saúde. O empreendedor desenvolve jogos eletrônicos que visam ensinar sobre doenças, tratamentos e a importância das vacinas. Uma pesquisa realizada com 254 estudantes pela Universidade de Tampere, na Finlândia, mostrou que aqueles que aprenderam sobre Covid-19 em um jogo desenvolveram mais interesse e curiosidade pelo assunto do que os alunos que aprenderam lendo um texto.
“As pessoas passam pelo menos 1,3 ano da vida delas jogando algum jogo. Jogos são a melhor forma de construir e quebrar hábitos – pensamentos, comportamentos, emoções. É uma forma de gerar engajamento e alcançar mais pessoas”, afirmou.
Olli falou sobre a importância dos games para o aprendizado dos jovens
Mudanças climáticas e desenvolvimento sustentável
Um dos grandes interesses do DCVMN é o aquecimento global, que tem mudado o rumo das doenças infecciosas no mundo. O coordenador da Agenda 2030 da Fiocruz e ex-presidente da instituição, Paulo Gadelha, que comandou a sessão Impacto das Mudanças Climáticas e Sustentabilidade Ambiental nesta sexta, afirmou que se trata de uma das maiores ameaças à saúde pública. “Temos visto casos de dengue, por exemplo, em locais onde antes o vírus não circulava”, disse.
Paulo ressaltou que o setor de saúde como um todo é responsável por cerca de 5,5% da emissão de Gases do Efeito Estufa (GEE), o que exige que a sustentabilidade seja uma das prioridades dos produtores de vacina. Cerca de 25% das emissões vindas da área da saúde são provenientes da produção, distribuição e uso de produtos farmacêuticos, de acordo com estudo da Universidade de Oxford.
Paulo Gadelha destacou os impactos da mudança climática
O diretor de Parcerias Estratégicas e Comunicação da PATH no Sul da Ásia, Ankur Mutreja, acrescentou que “a demanda por vacinas será cada vez maior. Por isso, é preciso investir em uma produção mais sustentável.”
Para o diretor de Compras da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), Daniel Rodríguez, o aquecimento global é um problema que requer soluções globais, e o DCVMN pode ser um importante aliado nesse sentido. “Como fabricantes, precisamos incentivar o comprometimento com a sustentabilidade e adotar estratégias como o uso de embalagens sustentáveis e reutilizáveis, de transportes de baixa emissão de gases e de energia renovável.”
Daniel Rodríguez destacou os problemas do aquecimento global
Reportagem: Aline Tavares
Fotos: Renato Rodrigues