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Patente do soro antiofídico foi doada por Vital Brazil ao governo paulista para salvar vidas; conheça a história

Descoberta da especificidade de cada soro revolucionou o tratamento de pessoas que sofrem picadas de cobras


Publicado em: 27/04/2023

Em 10 de maio de 1917, o médico sanitarista e primeiro diretor do Instituto Butantan, Vital Brazil, que faria 158 anos nesta sexta (28/4), recebeu a patente do soro antiofídico, publicada no Diário Oficial da União. A importância da invenção para a saúde pública era tamanha, que o pesquisador decidiu doar a patente ao governo do Estado de São Paulo em agosto do mesmo ano, ampliando o acesso ao produto. Sua descoberta de que os venenos de cada espécie de serpente exigiam um soro específico para serem neutralizados foi um grande marco no tratamento de picadas de cobras peçonhentas, registrado no famoso livro A defesa contra o ofidismo, publicado seis anos antes.

A produção de soros é um dos alicerces do Butantan, principal fornecedor desse imunobiológico no Brasil. Todo ano, o instituto entrega ao Sistema Único de Saúde (SUS) mais de meio milhão de unidades de soros contra venenos, toxinas de bactérias e o vírus da raiva para serem aplicadas gratuitamente na população. Em 2022, foram 556 mil ampolas. Só os soros contra venenos de serpentes salvam cerca de 30 mil pessoas por ano.

“O que Vital Brazil fez foi uma ação solidária para que o conhecimento gerado não ficasse concentrado na mão de um produtor só, já que o ofidismo era um grave problema de saúde pública. Ele antecipou a popularização da tecnologia para permitir que outros produzissem o soro, para que o tratamento chegasse a mais pacientes”, afirma o gerente de inovação e licenciamento de tecnologia do Butantan, Cristiano Gonçalves.

Soros contra picadas de cobras evitam sequelas físicas, neurológicas e morte causadas pelo veneno




Segundo o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), ter a patente de um produto significa ser proprietário do conhecimento e ter o direito de impedir terceiros de produzir, usar, vender ou importar aquele produto ou processo sem o seu consentimento. A invenção se torna pública obrigatoriamente depois de 20 anos, mas o detentor pode conceder a licença de sua patente a terceiros antes do vencimento, geralmente mediante remuneração.

“Quando medicamentos genéricos e biossimilares chegam ao mercado, por exemplo, significa que a patente dessas tecnologias expirou e, por isso, outras empresas podem produzir e comercializar o produto livremente. Isso reduz custos e facilita o acesso aos tratamentos”, explica Cristiano.

A partir do momento que Vital doou a sua invenção ao governo paulista, ele abdicou do direito exclusivo sobre o produto e permitiu a descentralização da produção do soro, possibilitando a sua ampla e gratuita distribuição para a população brasileira. Com isso, além do Butantan, outras instituições passaram a produzir os antivenenos, como o Instituto Vital Brazil (Rio de Janeiro) e a Fundação Ezequiel Dias (Minas Gerais).

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E não é só o Brasil que se beneficia dos feitos de Vital: o soro antiofídico é produzido hoje em mais de 30 países, em 46 laboratórios ao redor do mundo. Além disso, o Butantan exporta ampolas para países como Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, Colômbia, Panamá, Bermudas, República Dominicana, Trinidad e Tobago, Chile e Alemanha.

Anualmente, 400 mil vítimas de ofidismo no mundo ficam com sequelas permanentes. Ao todo, são 3 milhões de casos e 138 mil mortes por ano, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). A instituição considera o problema uma doença tropical negligenciada e tem a meta de reduzir pela metade as mortes relacionadas a acidentes ofídicos até 2030.

 

Hospital especializado

Dentro do Instituto Butantan, o Hospital Vital Brazil (HVB), criado em 1945, homenageia o médico sanitarista e é referência nacional e internacional no atendimento de pacientes acidentados com animais peçonhentos, como cobras, escorpiões, aranhas e lagartas. O hospital oferece atendimento 24 horas todos os dias da semana, além de auxiliar, por telefone, médicos de outras regiões do Brasil sobre como conduzir o tratamento do paciente e como identificar o animal que causou o acidente. Pessoas acidentadas que residem longe de São Paulo também podem entrar em contato com o HVB para receber orientações sobre os locais de atendimento mais próximos.

 

Reportagem: Aline Tavares

Fotos: Renato Rodrigues/Comunicação Butantan