Parte da equipe do Instituto Butantan tem o papel de conduzir o monitoramento constante do mercado com o objetivo de identificar novas tendências e analisar a viabilidade de implementação de tecnologias. Esse trabalho é realizado para promover a produção de novas terapias, sem descuidar do que já é feito com excelência pela instituição.
Olhar estratégico
A diretoria executiva tem um braço estratégico que tem sob sua responsabilidade quatro setores vitais para a contínua expansão da organização: Negócios, Escritório de Projetos, Qualidade e Assuntos Regulatórios e Área Médica, que juntos somam mais de 600 colaboradores. O diretor executivo da Fundação Butantan, Dimas Covas, desde o início de sua gestão, buscou consolidar a organização na vanguarda da produção e desenvolvimento de biofármacos não apenas no Brasil, mas em escala global.
Um exemplo que corrobora os esforços e a seriedade dos trabalhos desenvolvidos foi a entrada do Butantan no ranking dos top 10 produtores mundiais de vacinas por faturamento em 2021, de acordo com o último Global Vaccine Market Report, relatório divulgado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em novembro.
A consolidação do instituto como player mundial se segue à entrada, em março de 2021, da vacina Influenza trivalente do Butantan na lista de imunizantes pré-qualificados da OMS, um aval que permite o fornecimento do imunizante a outros países por meio da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Graças a essa certificação, um reconhecimento internacional às boas práticas de fabricação e à qualidade e eficácia da vacina, o Butantan foi contemplado pela primeira vez em editais de licitação da OPAS, exportando o imunizante para Equador (1 milhão de doses), Uruguai (700 mil doses) e Nicarágua (225 mil doses).
“Tivemos uma expansão grande por conta da CoronaVac. Devido à celeridade que o momento exigia, a área cresceu de forma muito orgânica. Mas, uma vez que a vacina foi disponibilizada para a população, a diretoria de Projetos Estratégicos detectou a necessidade de organizar essa frente e implementar estruturas e processos, uma vez que a área de pesquisas clínicas é extremamente regulamentada”, avalia a diretora médica do Butantan, Fernanda Boulos.
Com um histórico profissional de mais de 15 anos em farmacêuticas multinacionais e experiência internacional na alta gestão, a escolha de Fernanda para o comando da área médica foi estratégica, uma vez que foi detectada a necessidade de uma liderança com expertise em conduzir estudos clínicos já com foco no registro de novos produtos, junto aos órgãos reguladores nacionais e internacionais. “Trabalhamos com essa nova mentalidade e ter o conhecimento das situações regulatórias de outros países faz com que o time cresça mais rápido, além de otimizar a implementação de novas tecnologias com a qualidade necessária de dados”, completa Fernanda.
Reunindo 81 colaboradores e conduzindo 15 estudos clínicos, o próximo desafio da área é sofisticar os segmentos de dados e estatísticas, melhorando sua capacidade de análise e permitindo a construção de modelos preditivos que vão permitir uma proatividade também para fora dos estudos conduzidos – uma provocação que veio da própria diretoria de Projetos Estratégicos.
Hubert Guarino, atual diretor de Negócios do Butantan, também é uma liderança estratégica que veio do mercado para impulsionar o processo de internacionalização e diversificação do Instituto. Ex-Sanofi, empresa em que trabalhou por 28 anos, o executivo foi peça-chave no processo de incorporação da vacina da gripe pelo Programa Nacional de Imunizações, no final da década de 1990. No Butantan, sua principal missão é ampliar as frentes de negócio por meio de franquias e parcerias internacionais. “Temos uma grande responsabilidade por sermos um dos principais fornecedores do Ministério da Saúde. Minha contribuição é justamente manter a organização estruturada, de forma apropriada, para dar conta desse compromisso, mirando também as necessidades da América Latina e de outros países em escala global, assim como do mercado privado institucional”, explica o executivo.
Para corresponder a esses compromissos, a área foi desenhada para atender três pilares centrais. O primeiro são as franquias, que envolvem os produtos com alto potencial de exportação, como as vacinas Influenza, Chikungunya (desenvolvida em parceria com a farmacêutica francesa Valneva e que o Butantan será o fornecedor oficial dos países emergentes) e os imunizantes contra a Covid-19 (a CoronaVac, feita em parceria com a empresa chinesa Sinovac, e a Butanvac, que iniciará a fase 2 de ensaios clínicos em 2023). Já as outras vacinas, como HPV, hepatite A e B, raiva, tríplice bacteriana, dupla adulto e dupla infantil compõem a frente de parcerias estratégicas, cuja finalidade é acompanhar os processos de transferência e integração de tecnologia para produção dos imunizantes junto aos parceiros internacionais, que precisam acontecer dentro de um prazo de dez anos. Também é responsabilidade dessa frente negociar a disponibilidade de insumos e a programação de entrega de produtos. Por fim, há o pilar de novas tecnologias, que deve monitorar, avaliar e prospectar novidades e inovações relacionadas a plataformas de produção de imunizantes, com potencial para otimizar ou até mesmo substituir as atuais.
“É um planejamento essencial não apenas para um melhor posicionamento da instituição, mas também para um entendimento de quais serão os recursos que o Butantan irá receber e quanto ele poderá reinvestir, melhorando sua capacidade industrial, adquirindo novas tecnologias e participando de estudos clínicos de soluções promissoras”, completa.
Com tantos profissionais brilhantes dentro da instituição, é fato que nem todas as posições precisam ser ocupadas por pessoas oriundas do mercado privado ou de multinacionais. Há quatro anos no Butantan, o desempenho de Ana Carolina Ares a impulsionou ao posto de gerente do Escritório de Projetos, após trabalhar como coordenadora da área. Lidando com demandas de diferentes naturezas – desde o desenvolvimento de vacinas, como a ButanVac, até a reforma de prédios e a construção de novas plantas fabris –, o principal desafio da área está na comunicação e integração de times multidisciplinares. Hoje, o escritório conta com dez colaboradores, entre farmacêuticos, químicos, engenheiros, administradores e economistas que transitam por áreas como engenharia, qualidade, ensaios clínicos e Tecnologia da Informação.
“Somos como maestros em uma orquestra. O projeto em si não é nosso, mas temos a missão de viabilizar. Como estamos cientes de que mudanças vão acontecer no meio do caminho, buscamos trabalhar com times muito integrados, que vão minimizar esses impactos da melhor forma possível”, explica Ana Carolina. Atualmente, o escritório possui 41 projetos ativos (em 2018, eram 27), um volume que torna essencial a proximidade com a diretoria de Projetos Estratégicos, que faz a interface com a alta direção da instituição e direciona as prioridades em relação ao planejamento da empresa. “A Cintia contribui como um exemplo de liderança, competência e resiliência”, completa Ana Carolina.
A diretora de Qualidade e Assuntos Regulatórios do Butantan Patrícia Meneguello também reforça a importância dessa proximidade entre as quatro áreas que estão sob a divisão da diretoria de Projetos Estratégicos. “São setores com muita sinergia e que juntos conseguiram alavancar diversos projetos, como as exportações para a OPAS e as parcerias firmadas com outras farmacêuticas. Realizamos nossas entregas de forma mais efetiva, em um menor prazo e mais alinhadas às estratégias da companhia”, observa. Enquanto o setor de Qualidade garante que todos os processos envolvidos na produção de soros e vacinas estejam dentro dos requisitos estabelecidos pelas autoridades sanitárias, a área de Assuntos Regulatórios é quem faz a interface com os órgãos responsáveis, enviando documentações e negociando prazos, além de interpretar, viabilizar e implementar todas as regulamentações previstas nas atividades da instituição – os setores contemplam juntos mais de 500 colaboradores.
Em sua segunda passagem pelo Butantan, Patrícia teve como norte principal a ampliação para novos mercados. Além de atender às mais altas normas e padrões previstos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a instituição também se baliza conforme as regras da Food and Drug Administration (FDA), órgão regulatório dos Estados Unidos, e da própria OMS. “Outro objetivo foi separar os recursos para produtos existentes e em desenvolvimento. Como antes não tinha essa diferenciação, não restava muita oportunidade para desenvolver e inovar. Hoje, temos times dedicados para desenvolvimento e inovação, que atuam em parceria com outras áreas”, conclui.
Atuação durante a pandemia e transformações organizacionais
De acordo com Cintia Lucci, diretora de Projetos Estratégicos e responsável pelas áreas acima, grande parte do trabalho é o de organização de governança na empresa e o de promover reestruturações visando melhorias. “O principal desafio enfrentado pelo Butantan logo no início da crise desencadeada pelo novo coronavírus foi garantir que a instituição se adaptasse às novas demandas, sem comprometer suas atividades cruciais, em um momento em que o medo da morte era constante.” Cintia explica que na busca por um imunizante capaz de combater o SARS-CoV-2, a diretoria atuou junto às negociações com a farmacêutica chinesa Sinovac, garantindo a chegada daquela que seria a primeira vacina aplicada no braço dos brasileiros, a CoronaVac.
As ações encabeçadas pela diretoria de Projetos Estratégicos também têm provocado importantes mudanças na cultura da instituição. Única mulher no board de executivos, a diretora foi responsável pela criação do grupo Mulheres da Alta Gestão do Butantan, uma iniciativa que reúne gestoras de diferentes áreas para discutir soluções práticas e estabelecer metas que efetivamente aumentem o número de mulheres em cargos de liderança no Butantan. “A questão da sustentabilidade, da política de RH, de assédio moral e sexual e de racismo, são pautas que, quando aparecem na minha mesa, eu considero urgentes”, afirma a executiva.
Atualmente o Butantan ganhou reconhecimento mundial e passou a ser muito bem-visto não apenas por seus parceiros nacionais e internacionais, mas pelos próprios brasileiros, que reconhecem os feitos da instituição em benefício da saúde pública do país ao longo de seus mais de 120 anos de história.