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Jequitiranaboia: prima da cigarra, essa esquisitona das matas tem cara de jacaré, cor de serpente e asas com olho de coruja

Presente principalmente na região amazônica, espécie conhecida como Fulgora lanternaia até pode picar o ser humano acidentalmente, mas está longe de provocar um ferimento letal


Publicado em: 29/11/2023

Com cerca de 10 cm de comprimento e 12 cm de envergadura (da ponta de uma asa à outra), esse bicho reúne tantas características curiosas que é até difícil de acreditar que não se trata de uma personagem de ficção ou de uma heroína de história em quadrinhos. Seu nome popular está relacionado ao seu visual para lá de diferentão: jequitiranaboia, vem do tupi-guarani e significa “cigarra parecida com cobra” (yeki: cigarra; rana: parecido; mboya: cobra).

Para começar, sua cabeça lembra nada mais nada menos do que a de um jacaré. Além do formato igual ao do réptil, é possível ver claramente o desenho do que poderiam ser os dentões de sua bocarra. Mas tudo não passa de uma ilusão de ótica provocada pela coloração esverdeada combinada a detalhes em marrom, preto, branco e amarelo, que estampam o corpo do animal. 

 

Jacaré que voa? Coloração e estampas no corpo da jequitiranaboia permitem que o animal se camufle na natureza, afastando predadores

 

Outras marcas também lembram os olhos de algumas serpentes e até mesmo a chamada fosseta loreal – tipo de “buraco” entre a narina e os olhos das cobras, usado para identificar uma presa ou um predador pelo calor. Por isso, o bicho é popularmente conhecido como cobra-voadora, cobra-de-asa ou serpente-voadora.

A jequitiranaboia também possui dois pares de asas, sendo que no par posterior é possível observar uma estampa de formas arredondadas enormes, parecidas com os olhos de uma coruja, que ajudam a espantar possíveis predadores. Afinal, quando vista com as asas abertas, ela pode passar a impressão de ser bem maior do que realmente é.

Encontrado nas florestas da América Central e da América do Sul, o inseto faz parte da ordem Hemiptera – o nome faz referências às asas anteriores do animal, que apresenta uma metade membranosa enquanto a outra metade tem aspecto semelhante ao de um couro (coriácea). 

 

Exemplar de jequitiranaboia da Coleção Entomológica do Butantan visto de cima: estampa nas asas lembra os olhos de uma coruja

 

No Brasil, a espécie que leva o nome científico de Fulgora laternaria é vista principalmente na região amazônica, mas é difícil encontrá-la durante o dia, quando costuma descansar camuflada no tronco das árvores. Com o cair da noite, as jequitiranaboias ficam mais ativas e saem para se alimentar, sugando o caule de algumas plantas. Para isso, utilizam seu aparelho bucal em formato de “canudinho”.

Por ser rígido e afiado, esse dispositivo costuma ser confundido com um ferrão, uma vez que causa dor ao encostar acidentalmente na pele humana. Isso acontece porque a jequitiranaboia não possui nenhum tipo de anestésico em sua saliva e, como qualquer substância estranha que entra em contato com o organismo, pode provocar irritação.

A picada dolorida combinada ao visual que remete a bichos tão temidos na natureza faz com que esse inseto seja visto como muito perigoso. Em diversas regiões do país, por exemplo, acredita-se que ele seja portador de um veneno mortal, capaz de ressecar não apenas as árvores das quais se alimenta, como também os seres humanos que, porventura, recebem uma picada por manuseá-lo de forma errada – mas isso não passa de lenda. 

 

Detalhe da região da cabeça do animal, com marcas que parecem os dentes e olhos de um jacaré

 

JEQUITIRANABOIA

Espécie: jequitiranaboia, é o nome popular dos insetos do gênero Fulgora, principalmente a espécie Fulgora laternaria. Pertencem à família Fulgoridae. 

Onde habita: nas Américas Central e do Sul. Ocorre em todo o território brasileiro, principalmente na Amazônia

Características físicas: dependendo do ângulo, seu corpo pode parecer o de um outro animal. Visto de lado, o formato de sua cabeça lembra um jacaré, já suas cores podem recordar determinadas serpentes, como a jiboia. Quando abertas e vistas de cima para baixo, suas asas aparentam olhos de coruja.

Alimentação: néctar das flores e seiva de vegetais

Curiosidade: em 1987, o inseto estampou um selo especial dos Correios em celebração aos 50 anos da Sociedade Brasileira de Entomologia 

 

*Este conteúdo contou com a colaboração da curadora da Coleção Entomológica do Instituto Butantan, Flávia Virginio, e da bióloga e técnica Natália Batista Khatourian, ambas do Laboratório de Coleções Zoológicas do Butantan.

 

Reportagem: Natasha Pinelli

Fotos: Shutterstock (primeira imagem) e Renato Rodrigues/Comunicação Butantan