Mamar, dormir, trocar as fraldas, brincar e se vacinar. Nos primeiros anos de vida, as visitas ao posto de saúde para manter a vacinação em dia devem fazer parte da rotina de cuidados de um bebê. Se por um lado a sensação dos cuidadores é de alívio em ver seus pequenos protegidos, de outro é preciso lidar com o coração que aperta diante do choro sentindo que insiste em acompanhar as “picadinhas do bem”. Mas o que pouca gente sabe é que amamentar pode ser uma ótima maneira de reduzir a dor durante a administração de vacinas injetáveis em recém-nascidos, bebês e crianças.
Conhecida como mamanalgesia, a prática é recomendada desde 2015 pela Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, uma Nota Técnica do Ministério da Saúde em conjunto com a Coordenação de Saúde da Criança e Aleitamento Materno (COCAM), emitida em 2021, orienta que a estratégia seja adotada nas salas de vacinação do país.
Amamentação na hora da aplicação da vacina: conforto, sucção e distração reduzem o estresse e a dor
Segundo a OMS, cerca de 40% dos pais se preocupam com a questão da dor durante o processo de imunização – podendo, inclusive, impactar decisões futuras. Além disso, 95% dos cuidadores desejam aprender como reduzir o desconforto durante o procedimento.
Evidências científicas: mais contato, menos dor
Um estudo publicado no Canadian Medical Association Journal apontou que, ao amamentar durante a aplicação da vacina, fatores como conforto físico, sucção e distração, assim como a ingestão de açúcares e de outras substâncias presentes no leite materno, ajudam a reduzir o estresse e aliviar a dor. Também foram observados benefícios quando a amamentação aconteceu previamente ao procedimento, com a redução da angústia via saciedade.
Já uma revisão sistemática de dez ensaios clínicos, incluindo mais de mil crianças entre 28 dias e 1 ano de vida, mostrou que a adoção da mamanalgesia reduziu o tempo de choro e os escores de dor durante o procedimento quando comparada à ausência de qualquer intervenção, administração de água, glicose oral e outras bebidas adoçadas, carinho, anestésico tópico e massagem. Entre os recém-nascidos, o contato pele a pele, o calor, o som e o cheiro da mãe também são importantes aliados para diminuir a percepção da dor.
Mesmo as crianças mais velhas são beneficidas quando bem acolhidas durante o processo de vacinação
Orientações gerais
No caso das crianças que serão amamentadas, o primeiro passo é colocá-las na posição correta, ou seja, com a barriguinha encostada na barriga da mãe. O aleitamento pode ser iniciado de dois a cinco minutos antes da administração da vacina e mantido durante a aplicação da injeção.
Mesmo que o bebê chore, as mamães devem continuar oferecendo o seio, pois o pequeno provavelmente vai se acalmar mais rapidamente e retomar a mamada. A OMS reforça que a prática não traz nenhum tipo de efeito adverso, como risco de engasgos, aspiração do leite ou vômito.
Se houver vacinas orais e injetáveis a serem administradas no mesmo dia, deve-se fazer primeiramente a oral e, depois, iniciar a amamentação para que as injeções sejam realizadas.
Ainda de acordo com a entidade, até mesmo as crianças mais velhas são beneficiadas quando bem acolhidas durante o processo de imunização. Nesse caso, a orientação é colocá-las sentadas no colo do cuidador, que deve conversar, olhá-las nos olhos e oferecer carinho, mas sem mentir – como, por exemplo, dizendo “que não vai doer nada”. Usar brinquedos, músicas e vídeos para distraí-las durante o processo também pode ser válido.
De acordo com o Calendário Nacional de Vacinação, 17 vacinas são aplicadas desde o nascimento até os 9 anos de idade, sendo a maioria nos primeiros 15 meses de vida. A BCG, capaz de combater a tuberculose, e a hepatite B, que previne uma possível infecção do fígado causada pelo vírus, por exemplo, são aplicadas logo após o parto do bebê.
Luta pelo incentivo à amamentação
Entre os dias 1º e 7 de agosto acontece a Semana Mundial de Aleitamento Materno (SMAM), uma campanha global encabeçada pela OMS e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF). A ação é realizada desde 1992 e tem como objetivo promover o aleitamento materno até o sexto mês de vida, que pode se estender até os dois anos de idade ou mais.
No Brasil, desde 2017 foi instituída a lei que determina agosto como o mês do Aleitamento Materno. O período, que passou a ser popularmente chamado de Agosto Dourado, em referência ao padrão-ouro de qualidade do leite materno, prevê a intensificação dos programas de conscientização e esclarecimento sobre a importância do aleitamento materno.
Desde os primeiros momentos da vida de uma criança, a amamentação é a melhor forma de garantir a sobrevivência e o desenvolvimento infantil. A OMS e a UNICEF reiteram que a prática é essencial para proteger os bebês de doenças infecciosas comuns, além de estimular o sistema imunológico das crianças, fornecendo os principais nutrientes que elas precisam para crescer e desenvolver todo o seu potencial.
* Esta matéria contou com a contribuição da gerente de Farmacovigilância do Butantan e diretora da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) Mayra Moura.
Reportagem: Natasha Pinelli
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