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Butantan descreve pela primeira vez a composição do veneno do escorpião-marrom, predominante no Brasil

Estudo pode ajudar a entender os efeitos secundários do envenenamento e identificar moléculas com atividade terapêutica


Publicado em: 10/03/2023

Pesquisadores do Instituto Butantan foram pioneiros ao descrever a composição do veneno do escorpião-marrom (Tityus bahiensis), espécie que causa envenenamentos moderados a graves e é encontrada na Bahia e nas regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul do Brasil. Publicado no Journal of Proteomics, o trabalho possibilita o estudo das proteínas isoladas da peçonha, o que pode ajudar a compreender os efeitos secundários do envenenamento e até mesmo identificar moléculas com ação terapêutica. Nos últimos 10 anos, houve um aumento de 149,3% nas notificações de acidentes por escorpiões no país, de acordo com o Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde.

A análise das proteínas isoladas levou à descoberta de um peptídeo com atividade neuroprotetora, capaz de aumentar a quantidade de neurônios em cultura de células e em animais. O próximo passo será testá-lo em modelos animais de doenças neurodegenerativas, como Alzheimer e Doença de Huntington. “Como o veneno do escorpião é neurotóxico, nós testamos as toxinas em células do sistema nervoso. E assim identificamos esse peptídeo que, em vez de matar os neurônios, aumentava a sua viabilidade celular. A molécula em si já era conhecida, mas essa função nunca havia sido descrita”, explica o pesquisador Emidio Beraldo-Neto, primeiro autor do artigo.

Outro achado inédito foi a presença da enzima ACE no veneno, molécula nunca antes encontrada em escorpiões. Em mamíferos, essa enzima tem a função de regular a pressão arterial. Uma das hipóteses dos cientistas é que a ACE, junto com as hipotensinas na peçonha, poderia contribuir para os casos de variação de pressão arterial que são descritos nos envenenamentos.


Segundo o pesquisador Daniel Pimenta, orientador do estudo, os artigos costumavam descrever somente as proteínas predominantes dos venenos, que em geral eram as mais tóxicas e, consequentemente, mais importantes para o envenenamento. Mas o conhecimento que pode ser obtido a partir das peçonhas vai muito além. “A evolução dos sistemas de detecção permitiu identificar e caracterizar moléculas que antes não eram tão conhecidas, e que podem dar origem a novas ferramentas biotecnológicas”, aponta.

A pesquisa, que envolveu os laboratórios de Bioquímica, Genética e Farmacologia do Butantan, representa a primeira proteômica do veneno do escorpião-marrom – ou seja, a descrição completa das proteínas. É como uma biblioteca que pode servir de base para futuros estudos sobre evolução da espécie, envenenamento e até para a identificação de novas moléculas com propriedades farmacológicas. O trabalho foi possível porque outro grupo do instituto, liderado pelo pesquisador Inácio Junqueira de Azevedo, já havia publicado o transcriptoma do veneno desse escorpião, que descreve o RNA (genes podem vir a se tornar proteínas).

Acidentes com escorpião em São Paulo crescem 22%; veja como se proteger

No ano passado, houve um aumento de 22% nos casos de envenenamento por escorpião em São Paulo, segundo o Centro de Vigilância Epidemiológica. Em 2021, pela primeira vez, o estado registrou a maior taxa de acidentes do país, com 33.813 casos.  Os acidentes são mais comuns na zona urbana, durante o verão.

No Brasil, quatro espécies de escorpião possuem importância em saúde, ou seja, causam acidentes em seres humanos e são ameaças à saúde pública. Todas são do gênero Tityus: escorpião-amarelo (Tityus serrulatus), escorpião-marrom (Tityus bahiensis), escorpião-amarelo-do-nordeste (Tityus stigmurus) e escorpião-preto-da Amazônia (Tityus obscurus). Os escorpiões costumam ser encontrados em terrenos baldios com mato e entulho, locais com material de construção, caixas de gordura, lixeiras etc.

Saiba como prevenir acidentes: