Reportagem: Aline Tavares
Fotos: Shutterstock
Você sabia que pode ajudar a ciência mesmo não sendo cientista? O Museu Biológico do Instituto Butantan está estudando os saguis exóticos que habitam as matas do Parque do Butantan e da vizinha Universidade de São Paulo (USP), com o objetivo de entender seus impactos na fauna nativa e promover estratégias de manejo de animais silvestres em ambientes urbanos. Para isso, o apoio dos visitantes e frequentadores destas duas áreas verdes é fundamental, e você pode contribuir de uma forma muito simples: tirando fotos dos saguis que encontrar nesses locais.
Ao avistar um ou mais saguis dentro do Butantan ou da Cidade Universitária da USP, fotografe-os e envie as imagens pelo Whatsapp, iNaturalist ou Google Forms disponíveis neste site. Registros feitos em 2024 também podem ser enviados. Inclua a data, horário e local (com coordenadas) onde encontrou os animais e informações adicionais como quantidade de indivíduos, cor do tufo, se o sagui estava se alimentando e o que estava comendo, se havia presença de filhotes no grupo etc. Com essas informações, os pesquisadores poderão entender a distribuição geográfica e o comportamento dos primatas.
Lembre-se: para a sua segurança e a do próprio animal, não se aproxime e nem toque nele, apenas observe e faça o registro.
Os saguis que habitam o Butantan e a USP são híbridos entre duas espécies exóticas à Mata Atlântica: o sagui-de-tufo-branco (Callithrix jacchus) e o sagui-de-tufo-preto (Callithrix penicillata), naturais da Caatinga e do Cerrado, respectivamente. Essas espécies chegaram ao Sudeste do país por meio do tráfico de animais silvestres e se dispersaram pela região, eventualmente se adaptando aos centros urbanos. Como são consideradas invasoras, é preciso entender os impactos que sua presença pode gerar na fauna nativa, em especial na predação de ninhos de aves.
“Cada vez mais, temos mais pessoas vivendo nas cidades e animais silvestres se adaptando a zonas urbanas. Entender como coexistir com a fauna urbana de forma saudável e quais as implicações dela em nosso ambiente é muito importante para a conservação”, afirma a pesquisadora científica do Instituto Butantan e diretora do Museu Biológico, Erika Hingst-Zaher, coordenadora do projeto.
Intitulado Saguis do Butantan, o estudo é multidisciplinar e conta com a colaboração dos estudantes da USP Louise Schneider, mestranda em Ecologia; Isabella Schroter, graduanda em Biologia; e José Otávio Colombini, graduando em Engenharia. Isabella usará os dados recebidos para criar um mapa da interação entre saguis e humanos, mostrando os principais pontos onde eles se encontram, enquanto Louise irá monitorar o comportamento e uso do ambiente dos animais, incluindo os locais por onde eles passam, onde dormem e como interagem entre si. Para isso, em parceria com a Escola Politécnica da USP, José Otávio está ajudando a desenvolver um equipamento de monitoramento customizado para os saguis, que será instalado em coleiras que os animais receberão durante o período do estudo. É possível acompanhar o andamento do projeto pela página do Instagram.
Segundo Erika, a prática de utilizar equipamentos para monitorar animais silvestres é muito comum, mas muitas tecnologias exigem que o pesquisador recapture o animal para só então extrair os dados do equipamento. A proposta do projeto é usar uma estratégia inovadora, que permite o acesso dos dados à distância. “A ideia é espalhar vários microchips pelas florestas onde os saguis vivem, que vão funcionar como ‘roteadores’ e propagar os dados em uma rede. Assim as informações chegam ao biólogo diretamente”, explica José.
Ciência cidadã
Ao envolver a sociedade, o estudo busca incentivar o interesse da população pela ciência e pela conservação e promover a conexão com a natureza. “A colaboração do público é fundamental para obtermos um volume de dados que jamais conseguiríamos sozinhos. E em uma era de negacionismo da ciência, é muito importante fazer com que as pessoas entendam e participem dos processos científicos”, destaca Erika.
Conscientizar a população sobre o convívio saudável com os saguis é outro desdobramento do estudo. Segundo a pesquisadora, esses primatas foram capturados ilegalmente durante muito tempo para serem vendidos como animais de estimação, mas é importante enfatizar que eles são animais silvestres e, por isso, devem permanecer na natureza. Além disso, devemos evitar o contato direto e não alimentá-los.
“O sagui não é um animal para você ter em casa. O contato próximo favorece a transmissão de vírus, como o da raiva. E ao dar alimentos, nós interferimos em sua dieta e podemos prejudicar sua saúde. Mas é possível coexistir de forma segura: observe os saguis, tire fotos, admire-os, mas não os alimente e respeite seu espaço”, aponta Erika.
Para Isabella, a conservação envolve compreender o papel de cada ser vivo no ambiente. “Se você tem amor, se entende a importância de um ser vivo não de uma forma utilitária para o ser humano, mas para a própria natureza, é assim que podemos ajudar na conservação”, diz.