Desde a sua criação, no início do século XX, o Instituto Butantan tem recebido inúmeras visitas de ilustres notáveis. São políticos, cientistas, monarcas e artistas de todas as partes do mundo que vêm conhecer as dependências da instituição e suas ações em prol da saúde pública. Entre 1914 e 1979, boa parte desses visitantes deixaram sua marca no Livro de Atas e Assinaturas do Serumtherapico Butantan – entre eles está a ganhadora do Prêmio Nobel Marie Curie e o atual Rei da Inglaterra, Charles III.
Os primeiros registros do documento, carinhosamente apelidado de “Livro de Ouro”, referem-se à inauguração em 1914 do Prédio Central, atual Edifício Vital Brazil. Além das rubricas, o documento registra solenidades históricas, como a segunda posse de Vital Brazil como diretor do Instituto, em 1924, e mensagens e impressões deixadas pelos visitantes. Atualmente, o livro encontra-se sob a guarda do Centro de Memória do Instituto Butantan e pode ser consultado mediante agendamento prévio.
A seguir, conheça quatro personalidades que deixaram seus nomes nas páginas da história do Butantan e do mundo:
A física e química Marie Curie visitou o Instituto Butantan quando viajou para o Brasil na década de 1920
Marie Curie
Primeira mulher ganhadora do Prêmio Nobel e única pessoa até hoje a ser laureada em duas categorias técnicas diferentes – física em 1903 e química em 1911 –, a polonesa naturalizada francesa Marie Curie (1867-1934) esteve no Instituto Butantan em agosto de 1926. A visita fez parte de uma série de compromissos assumidos pela cientista durante uma viagem de 45 dias pelo Brasil, em que conferiu diversas palestras sobre suas descobertas relacionadas à radioatividade.
Madame Curie palestrando na Academia de Medicina; foto divulgada em revista da época
Depois de passar alguns dias no Rio de Janeiro, Madame Curie, como era chamada, chegou no dia 13 de agosto a São Paulo, onde permaneceu por três dias a convite do então governador da província, Washington Luís. Na ocasião, a cientista fez uma demorada visita ao Instituto Butantan junto da sua filha mais nova, Irène (1897-1956), tendo elogiado a organização e seus objetivos. A assinatura da cientista consta na página 183 do Livro de Atas e Assinaturas.
A fama internacional de Curie despertou a atenção da imprensa brasileira da época, que dedicou diversas matérias à visita da polonesa. Uma manchete do periódico O Jornal, por exemplo, destacou a cientista como “A mulher mais sábia do mundo”; com o subtítulo “A entrevista difícil”, O Globo dedicou um espaço importante à pesquisadora, que falou sobre temas relacionados à educação da mulher e igualdade de gênero.
A Família Real da Bélgica visitou o Butantan em 1920; na década de 1960, o então Rei Leopoldo III retornou à organização
Rei Alberto I e Rei Leopoldo III
Entre 19 de setembro e 15 de outubro de 1920, o Brasil recebeu o primeiro monarca europeu a visitar a América do Sul: o Rei Alberto I da Bélgica (1875-1934), acompanhado da Rainha Elisabeth (1876-1965) – ou Isabel da Baviera. Conhecido como o “rei soldado” por conta da sua atuação na Primeira Guerra Mundial (1914-1918), o soberano chegou no país pelo porto do Rio de Janeiro e permaneceu na cidade por cerca de duas semanas até partir para a capital paulista no dia 5 de outubro, onde desembarcou pela Estação da Luz.
Rei Leopoldo da Bélgica observa exposição realizada nas dependências do Instituto Butantan em 1962
Dois dias depois, em 7 de outubro, o filho mais velho do casal – o então Príncipe Leopoldo (1091-1983) – juntou-se à comitiva internacional. Nessa mesma data, foi realizada uma visita ao Butantan. Acompanhada pelo governador do estado à época, Washington Luís, e o diretor do Instituto, Afrânio do Amaral, a Família Real Belga conheceu o Edifício Central (atual Edifício Vital Brazil) e o serpentário.
Passadas quatro décadas, em 1962, Leopoldo III – então coroado Rei da Bélgica – retornou às dependências do Butantan, dessa vez acompanhado pela esposa, a Princesa Lilian (1916-2002). Na ocasião, o monarca visitou o Pavilhão Lemos Monteiro e observou o manejo de serpentes, guiado por nomes importantes da diretoria do Instituto, como Alphonse Richard Hoge, herpetólogo que atuou no Butantan entre 1946 e 1982; Wolfgang Bücherl, então chefe da Divisão de Zoologia Médica; e o médico e pesquisador Fauze Carlos. No “Livro de Ouro”, as assinaturas dos membros da Coroa da Bélgica aparecem na página 135.
O atual Rei Charles visitou o Butantan durante a primeira vez em que esteve no Brasil, na década 1970
Rei Charles
Foi no ano de 1978, quando tinha 29 anos, que o então Príncipe Charles, atual monarca do Reino Unido, pisou pela primeira vez em solo brasileiro. A visita oficial teve duração de dez dias em retribuição à viagem que o presidente do Brasil na época, o general Ernesto Geisel, havia feito à Inglaterra dois anos antes. O Rio de Janeiro foi o primeiro ponto de parada da comitiva internacional. Lá, Charles visitou o Corcovado – mas não apreciou a bela vista por conta da neblina que pairava sobre a cidade – e desfrutou de um “carnaval particular” na famosa Praça da Apoteose.
Charles em visita à coleção herpetológica. À esquerda, é possível observar o "Livro de Ouro" sendo carregado pela colaboradora do Butantan (de branco), que integrou a comitiva de recepção ao monarca
Em 10 de março, o atual monarca da Inglaterra esteve em São Paulo e conheceu as dependências do Instituto Butantan na companhia do ex-diretor da instituição à época, Fauze Carlos; do herpetólogo Alphonse Richard Hoge; e do então diretor do Museu Biológico, Henrique Moisés Canter. Imagens da visita mostram que Charles assistiu a uma demonstração de manuseio de serpentes, além de ter conferido exemplares da coleção herpetológica do Butantan.
Poucos dias depois, no dia 13 de março, o príncipe foi recebido pelo general Ernesto Geisel no Palácio da Alvorada, em Brasília (DF). As assinaturas de Charles e dos representantes de sua comitiva estão registradas na página 193 do Livro de Atas e Assinaturas.
Você sabia? Novo rei do Reino Unido visitou o Butantan nos anos 70
O brasileiro responsável pela invenção do avião esteve no Butantan no ano de 1916
Alberto Santos Dumont
Infelizmente, quase não há registros sobre a visita ao Instituto Butantan do brasileiro que ganhou o título de “pai da aviação”. A assinatura de Santos Dumont encontra-se na página 32 do “Livro de Ouro” e, analisando os registros feitos anteriormente e posteriormente aos dele, pode-se afirmar que o inventor conheceu as dependências do Butantan entre julho e agosto de 1916. Matérias publicadas na imprensa da época mostram que a data coincide com o retorno de Santos Dumont ao Brasil após um período de quase dois anos no exterior.
Acredita-se que Santos Dumont visitou o Butantan ao retornar para o Brasil, depois de ficar por quase dois anos fora do país
Antes de pisar em solo nacional, o aeronauta natural de Minas Gerais passou pelos Estados Unidos, Chile e Argentina. No sul do país, conheceu as Cataratas do Iguaçu e se encantou com as belezas da região. Ao descobrir que aquelas terras eram de propriedade particular, Santos Dumont decidiu ir até Curitiba propor ao então presidente do Paraná (espécie de governador da época) a criação de um parque. Como não havia estrada em boa parte do caminho, ele enfrentou um percurso de mais de 300 quilômetros e seis dias a cavalo. A jornada ficou conhecida como “Cavalgada Patriótica” e contribuiu para a criação do atual Parque Nacional do Iguaçu.
Referências:
ACERVO ESTADÃO. Santos-Dumont em 1916: ‘avião será veículo de passageiros’
ACERVO O GLOBO. Príncipe Charles
BRASILIANA FOTOGRÁFICA. A viagem dos reis da Bélgica ao Brasil sob as lentes de Guilherme Santos
CONSELHO REGIONAL DE QUÍMICA. Marie Curie no Brasil
SOCIEDADE BRASILEIRA DE HISTÓRIA DA CIÊNCIA. La visite de Marie Curie à Rio de Janeiro en 1926 et la presse brésilienne
Reportagem: Natasha Pinelli
Fotos: Biblioteca Nacional/Revista da Semana (foto 2); Acervo Instituto Butantan/Centro de Memória (fotos 4 e 6); Instituto Moreira Salles/Brasiliana Fotográfica (foto 8)
Arte: Milena Martins do Nascimento