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Trabalhadoras, fiéis e essenciais para a vida na Terra: conheça o universo maravilhoso das abelhas

Além de viverem em uma sociedade organizada e produzirem sua própria comida, esses insetos garantem que frutas, verduras e legumes nutritivos cheguem aos pratos das pessoas


Publicado em: 03/10/2023

Elas são pequeninas e vivem voando nos bosques, florestas e jardins. Têm visão apurada, dois “baldinhos” acoplados às pernas onde carregam o pólen das flores, e são as grandes responsáveis pela diversidade de frutas, verduras e legumes disponíveis no planeta. Está ouvindo o zumbidinho por aí? São as incríveis abelhas – para muitos, os seres vivos mais importantes do mundo!

Vivendo no planeta Terra há cerca de 125 milhões de anos, elas integram a ordem dos Hymenopteras, que significa “asa membranosa”. Possuem cinco olhos: dois nas laterais da cabeça, compostos por milhares de olhinhos que enxergam pontos específicos e, juntos, formam uma imagem completa; e outros três bem menores no topo da cabeça, que captam informações relacionadas a cor e luz. Já as antenas são responsáveis pelo olfato, tato e audição. 

 

Apis Mellifera com seu "baldinho" e parte do corpo coberto de pólen

 

As abelhas têm três pares de pernas com características e funções diferentes. As da frente possuem micropelos que funcionam como uma escova para limpeza dos olhos, antenas e língua. As intermediárias contam com um esporão, usado para limpar as asas e as cobírculas – tipo de “cesto” onde o pólen das flores é armazenado, encontrado nas pernas traseiras de algumas espécies.

Mais de 20.000 espécies de abelhas já foram catalogadas, sendo que algumas podem viver sozinhas ou em enormes grupos. Entre as 2.500 que vivem no Brasil, a mais famosa é a Apis mellifera, aquela com listras pretas e amarelas no corpo, famosa pela fabricação de mel e, também, pelas ferroadas doloridas – mas isso não é motivo para antipatia, pode acreditar.

 

Cabeça em detalhe: a visão lateral é formada por pequenos micro-olhos; no topo, o trio de olhos que completa o sistema visual

 

“Temos diversas abelhas nativas que, inclusive, não possuem ferrão. Porém, é curioso pensar que a mais popular surgiu de um cruzamento acidental. No final da década de 1950, pesquisadores trouxeram uma espécie da África para estudo, mas elas acabaram fugindo e cruzaram com a abelha-europeia, que já estava aqui há tempos”, conta a curadora da Coleção Entomológica do Laboratório de Coleções Zoológicas do Instituto Butantan, Flávia Virginio. 

“Infelizmente temos notado uma queda na população de abelhas. As principais ameaças são o uso excessivo de agrotóxicos e os impactos da mudança climática”, alerta. As espécies nativas tem sofrido ainda mais, devido a uma competição direta com a Apis mellifera por alimento e território. “Muitas vezes essa disputa é desleal e desigual. Por mais que as nativas sejam as ‘donas’ do local, a Apis é mais reativa e costuma atacar em maior número, deixando as outras abelhas à mercê.

 

Maior em tamanho e única na colmeia, a abelha-rainha (ao centro) se destaca em relação às outras operárias

 

Família real

Sociável entre elas – com humanos, podem não ser muito amigáveis –, a Apis mellifera tupiniquim vive em colmeias que podem acumular dezenas de milhares de indivíduos. Mas a boa convivência só é garantida porque existe uma divisão muito bem estabelecida de tarefas. 

Em cada colônia da espécie, por exemplo, só existe espaço para uma abelha-rainha. Inclusive, a soberana recebe tratamento diferenciado mesmo antes de nascer. O ovo com a chamada “princesa” é depositado em um espaço nobre, conhecido como “realeira”. Ela também é a única que se alimenta de geleia real, um alimento rico em carboidratos, proteínas, lipídios e vitaminas, durante toda a sua fase larval e vida adulta. 

O processo de sucessão se estabelece quando a rainha de uma colônia morre ou fica doente. Outra possibilidade é pela superpopulação da colmeia. No caso da Apis mellifera, é a rainha dominante quem deixa sua antiga “casa” acompanhada por parte de seus súditos para fundar um novo enxameamento, abrindo caminho para a ascensão da princesa.

Maior em tamanho, apenas a futura abelha-rainha tem a capacidade de procriar e gerar descendentes, assegurando a continuação do grupo. Quando sexualmente madura, a princesa sai brevemente da colmeia para realizar o “voo nupcial”, que pode acontecer apenas uma vez.

É neste momento que os zangões entram em ação. Os machos das abelhas têm como único objetivo de vida – que é breve e dura cerca de dez dias – fecundar a princesa. Para isso, eles passam o dia fora da colônia, esperando o momento certo. Quando não há sucesso na empreitada, eles retornam à colmeia para se alimentar e descansar, mas caso o zangão conclua com êxito a tarefa ao qual foi designado, seu destino é um só: a morte.

A princesa é devidamente coroada após a fecundação, tornando-se assim a nova abelha-rainha. A partir desse momento, ela passa a colocar 2.000 ovos por dia, em média, sendo que o sexo e as atividades desempenhas pelas futuras abelhinhas são definidos pela própria matriarca, de acordo com as necessidades da sociedade. Por meio da liberação de compostos químicos conhecidos como feromônios, a poderosa chefona também coordena o trabalho de todos os indivíduos, garantindo o bom convívio no grupo.

 

A fantástica fábrica de mel

As abelhas-operárias completam a estrutura social da colônia. “Elas são extremamente fiéis e fazem de tudo para proteger sua rainha”, afirma Flávia Virginio. Além de serem responsáveis pela limpeza e construção de espaços, pelo cuidado das larvas e pela segurança da colmeia, elas colocam a mão na massa para fabricar o mel que servirá de comida aos moradores durante o outono e o inverno, quando há menos flores – e, portanto, menos néctar – disponíveis.

Parte do nobre trabalho culinário é realizado pelas operárias-forrageiras – experientes, elas já passaram por todas as funções internas da colmeia antes de ir a campo buscar os “ingredientes” que compõem a deliciosa receita. Depois de sugar o néctar das flores e armazená-lo em um segundo estômago, as forrageiras retornam para a colônia e entregam o material coletado a outra classe de operárias que irão “mastigar” o líquido, deixando-o viscoso. Em seguida, o mel é depositado em um favo e as abelhas batem suas asas para terminar de secá-lo.

 

Aposento real: até a "casinha" onde a abelha-rainha vive dentro da colmeia é mais espaçosa

 

Dia Nacional da Abelha

Além de produzir o próprio alimento, as forrageiras contribuem para a oferta de alimentos vegetais. Isso porque, ao voarem de flor em flor, retirando o pólen e o néctar, elas fazem a polinização. Essa transferência de grãos de pólen permite a reprodução das plantas, resultando na formação de frutos mais gostosos e nutritivos.

As abelhas são o maior grupo de polinizadores da natureza. No Brasil, representam quase metade das espécies que visitam plantações e hortas produtivas. Para celebrar a importância dessas pequenas essenciais, o dia 3 de outubro marca o Dia Nacional da Abelha

“Infelizmente temos notado uma queda na população de abelhas. As principais ameaças são o uso excessivo de agrotóxicos e os impactos da mudança climática”, alerta a curadora da Coleção Entomológica do Butantan. A falta de abelhas pode comprometer a existência de um terço dos alimentos disponíveis no planeta, como o café, o feijão, o tomate, o melão, a melancia e a laranja. “Precisamos nos lembrar que nosso bem-estar está intimamente ligado à boa saúde dos animais e do meio-ambiente. Necessitamos encontrar esse equilíbrio o mais rápido possível”, completa Flávia.

 

Referências:

Associação Brasileira de Estudos das Abelhas

Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos. Relatório Temático sobre Polinização, Polinizadores e Produção de Alimento no Brasil

Universidade de São Paulo. Guia Ilustrado de Abelhas Polinizadoras no Brasil

United Nations Environment Programme. Why bees are essential to people and planet

 

Reportagem: Natasha Pinelli

Fotos: Shutterstock