Em 2023, houve aumento na cobertura vacinal de 8 vacinas recomendadas para crianças de até um ano de idade: hepatite A, pneumocócica, meningocócica, vacina contra poliomielite, DTP (difteria, tétano e coqueluche), tríplice viral (para sarampo, caxumba e rubéola) e varicela (também conhecida como catapora). Essa é uma ótima notícia para a saúde pública brasileira e o Programa Nacional de Imunizações (PNI), que busca retomar os altos índices de imunização infantil, em queda no país desde 2016. Neste Dia Mundial da Infância, o Butantan reforça a importância da vacinação dos pequenos, um direito garantido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente no seu artigo 14.
Um avanço de décadas
Antes da criação do PNI, na década de 1950 e 1960, era comum que as crianças brasileiras sofressem com doenças imunopreveníveis como sarampo, rubéola, coqueluche (na época chamada de tosse comprida), pneumonia grave, meningite, epiglotite e poliomielite, entre outras. Doenças graves e que muitas vezes levavam ao óbito ou deixavam sequelas para o resto da vida. Com a criação de uma estratégia nacional de vacinação voltada para crianças, essas enfermidades foram reduzidas ou controladas. A vacinação é considerada a segunda intervenção de saúde de maior impacto na diminuição de complicações e mortalidade da população, abaixo apenas do saneamento básico e do tratamento da água, conforme explicam os autores Stanley Plotkin, Walter Orenstein, Paul Offit e Kathryn Edwards no livro Plotkin’s Vaccines.
Um dos indicadores que expressa essa conquista é a diminuição na taxa de mortalidade infantil do Brasil. Entre as décadas de 1980 e 1990, este índice registrou queda de 5,5%, e continua diminuindo cerca de 4,4% ao ano desde 2000, de acordo com o Ministério da Saúde. Um dos motivos para isso é justamente a cobertura vacinal.
A maioria dos imunizantes recomendados para crianças protegem de enfermidades que trazem um risco ampliado de complicação e óbito justamente nesta faixa etária – como a vacina BCG, que previne contra as formas graves da tuberculose e deve ser aplicada nos primeiros meses após o nascimento.
“Um exemplo da diferença na gravidade das doenças entre adultos e crianças é o pneumococo, bactéria que pode ser combatida pela vacina pneumocócica. Quando atinge um adolescente ou um adulto, ela pode resultar em uma doença localizada, como pneumonia, otite ou sinusite. Num bebê pequeno ou lactente, por outro lado, causa doença invasiva, com risco de meningite, septicemia e óbito. O sarampo é parecido: quanto menor a criança, maiores as complicações”, relata a médica pediatra e gestora médica de desenvolvimento clínico do Instituto Butantan, Carolina Barbieri.
O calendário do PNI foi pensado com o enfoque no início da vida da criança porque é quando acontece o maior risco de complicações e gravidade de algumas doenças preveníveis por vacina, pela imaturidade do seu sistema imunológico. O amadurecimento do sistema imunológico vai aumentando gradativamente, com a “maturidade imunológica” se estabelecendo por volta de um ano e meio a dois anos.
Está em dúvida sobre quais vacinas são necessárias em cada estágio da vida da criança? No site do Ministério da Saúde é possível conferir as vacinas infantis específicas e as que são ideais para as demais faixas etárias.
Vacinas em crianças são perigosas?
Não! As vacinas disponíveis para uso foram testadas por estudos científicos em relação à sua segurança e eficácia. Elas são seguras e buscam gerar uma defesa contra doenças dos mais diversos tipos. Algumas reações no corpo da criança, que podem envolver pequenas dores e vermelhidões localizadas, acontecem porque o sistema imunológico está trabalhando para garantir a proteção do organismo contra um agente patogênico, são geralmente leves e duram menos de 1 dia. É uma resposta esperada que ocorre em todos nós. As crianças não registram mais nem menos efeitos adversos que as pessoas de outras faixas etárias. O choro e o incômodo são frequentes, é verdade, mas configuram reações normais dos pequenos, um público mais sensível à dor da agulhada.
É importante ressaltar também que vacinas não atrapalham ou danificam o sistema imunológico. “Há vários estudos que comprovam que uma criança que não é vacinada pode ter mais doenças imunopreveníveis do que a que foi vacinada. Não há, por outro lado, comprometimento do sistema imunológico pela vacinação, conforme evidências científicas”, resume Carolina.
Atrasei uma das doses da vacina da criança, posso levar para tomar as outras ainda assim?
Sim! O cronograma ideal do PNI é uma espécie de guia que orienta a melhor época e o menor tempo possível para que a criança seja protegida contra determinadas doenças. Se é uma vacina que tem um calendário de múltiplas doses (em dois, quatro e seis meses, por exemplo – caso da vacina pentavalente e da vacina contra poliomielite), a criança estará protegida após duas semanas do esquema completo. Se houver um atraso na aplicação de alguma das doses, ela permanecerá suscetível à doença por mais tempo, já que a proteção vai ser parcial e o efeito pretendido não será alcançado.
No entanto, o atraso não impede ou altera a eficiência da vacina. Se o cartão de vacinação estiver atrasado, a recomendação é procurar um serviço médico ou posto de saúde o mais rápido possível para receber as doses que faltam. O nosso sistema imunológico possui uma memória que reconhece os “rastros” da primeira dose de uma determinada vacina. Mas vale lembrar que, para que a efetividade da vacina seja máxima, o esquema precisa ser completado com todas as doses recomendadas pelas autoridades sanitárias.
Vacinar durante a infância fortalece a imunidade coletiva
Para Carolina, uma das principais vantagens da vacinação na infância é o fortalecimento da imunidade coletiva. “A criança é responsável pela disseminação dos vírus na comunidade em que está inserida, seja na escola ou em casa. Há a possibilidade de transmitir algo para quem tem risco, como uma gestante ou idoso da família, por exemplo. A vacina, além de proteger a criança de uma complicação de saúde, também protege a coletividade de uma transmissão”, diz a médica.
Reportagem: Guilherme Castro
Fotos: Renato Rodrigues/Comunicação Butantan e Shutterstock