Nesta edição do Você no Butantan, conversamos com o gerente de Parcerias Estratégicas e Novos Negócios, Tiago Tadeu Rocca de Moraes, 36. Paulistano e farmacêutico industrial de formação, ele nos contou sobre a sua carreira e trajetória de 12 anos na instituição. Explicou também como são realizadas as parcerias do Butantan com outras farmacêuticas para a produção de vacinas e medicamentos e quais os impactos disso para a saúde pública. “Esse combo que envolve o SUS [Sistema Único de Saúde], o Butantan, o trabalho com a prevenção de doenças e o alcance que a gente tem à uma grande parcela da população torna esse trabalho gratificante para um profissional da saúde como eu”, afirma.
Butantan Notícias - Como começou a sua carreira e como ingressou no Butantan?
Tiago Rocca - Depois de me formar eu passei por diferentes áreas. Passei por varejo, por iniciação científica voltada para pesquisa em vigilância sanitária e pela área hospitalar no Hospital da Aeronáutica aqui em São Paulo. Então, depois eu comecei a direcionar minha carreira na área industrial, no meu último ano da faculdade, estagiei na Furp (Fundação para o Remédio Popular) e depois que finalizei o meu curso, eu entrei no Butantan. Eu comecei aqui como analista júnior, em 2007, na área de Qualidade, onde fiquei por sete anos e passei por todas as funções. Participei, inclusive, da transferência de tecnologia da vacina da gripe até a conclusão, que foi um dos principais projetos da história da instituição. Então, ver a fábrica nascer aqui no Butantan, ver esse projeto ser concluído e ver os ganhos que a instituição tem com ele é muito gratificante. Essa experiência me levou a, em 2013, ser convidado para iniciar o trabalho de um escritório de transferência de tecnologia, porque, como o projeto da gripe tinha sido um sucesso, o Butantan procurou outras parcerias que tivessem esse formato de transferência de tecnologia de produtos já existentes para conseguir novas plataformas tecnológicas.
Daí, surgiram projetos como a da vacina de HPV e a da Hepatite A com a MSD, a vacina tríplice acelular com a GSK, também vieram os anticorpos monoclonais com a Libbs, entre outras parcerias, e a gente, com o passar do tempo e com o aumento de equipe, não se restringiu somente aos acordos de transferência de tecnologia, mas também ao que a gente chama hoje de parcerias estratégicas. Fizemos acordo com a LG, da Coreia do Sul, com a Sanofi, da França... Então, hoje, a gente tem um leque de parceiros com projetos de longo prazo, seja para assistência técnica, seja para licenciamento, seja para transferência de tecnologia, seja para fornecimento de produtos.
E a conquista de todos esses parceiros acabou trazendo também para o meu departamento a função de desenvolvimento de novos negócios, então a gente acompanha, desde a entrada do parceiro como um possível negócio, desenvolve esse negócio até se concretizar numa parceria estratégica para um produto para a instituição.
BN - Você disse que o carro-chefe da sua área é a transferência de tecnologia. Mas o que é, na prática um processo de transferência de tecnologia?
Tiago - No processo de transferência de tecnologia, nosso foco é um produto e toda a tecnologia envolvida na produção e na qualidade deste produto. É o que a gente chama de “plataforma tecnológica”. A transferência de tecnologia não é a transferência do produto em si. O produto é apenas o objeto de referência. A transferência de tecnologia envolve a estrutura fabril e de qualidade que faz com que a gente tenha um produto, uma vacina, um medicamento, no final. Na verdade, essa plataforma absorvida acaba servindo para originar outros produtos, que é o que a gente tem hoje com a vacina da gripe. Nessa caso, na época a gente transferiu uma tecnologia de uma vacina da gripe sazonal, mas que hoje permite ao Butantan desenvolver novas tecnologias tanto para a gripe sazonal, quanto para a gripe pandêmica, com produtos adjuvantados, etc. A herança que você tem de uma transferência de tecnologia é o know-how, a formação de pessoas, o desenvolvimento do parque fabril, sendo que cada produto vai estar relacionado, obviamente, à uma plataforma tecnológica distinta.
BN - E quais são as diferenças entre as parcerias que o Butantan tem hoje?
Tiago - O arranjo da parceria vai de acordo com a necessidade da própria instituição, então a gente tem parcerias que visam a transferência completa do produto, parcerias de co-desenvolvimento, ou seja, onde a gente junta partes de plataformas tecnológicas já existentes do Butantan com a plataforma de um parceiro. Mantemos também um relacionamento para assistência técnica e para a manutenção e melhorias da plataforma tecnológica. O que eu costumo dizer é que os acordos são únicos, cada parceiro, cada objeto, cada produto tem um acordo diferente e, no fim, ele tem apenas o mesmo resultado que é fornecer o produto, a vacina, o medicamento para o SUS. Para conseguirmos alcançar algumas metas audaciosas que nos foram propostas, a de nos tornarmos um importante produtor de vacina internacionalmente, por exemplo, precisamos renovar portfólio e adquirir novas tecnologias. Buscamos acordos também para exportar tecnologia, justamente nessa estratégia de posicionamento de mercado. Então, a variedade dos acordos aqui é muito grande, cada parceiro, cada cultura, cada produto é diferente.
BN - E o que você gosta de fazer nas horas vagas?
Tiago - Eu não gosto muito de ficar em casa. Gosto de sair, de viajar quando tenho um tempo livre, um feriado, então, nos fins de semana eu procuro passear pela cidade, viajar, visitar a família e os amigos. Gosto muito também de atividades ao ar livre. Procuro passeios que me proporcionem o contato com a natureza. Por esse motivo, o esporte ao qual tenho me dedicado mais ultimamente é o mergulho. Fiz a minha primeira certificação três anos atrás e, principalmente no verão, costumo ir para o mar e mergulhar. Acho que, além de um esporte, é uma terapia, porque você se desconecta completamente do plano daqui. É uma outra interação e uma forma de você se renovar, então é a atividade que eu tenho feito com muito gosto mais ultimamente. Eu gosto bastante de viajar e, mesmo que algumas das viagens sejam a trabalho, daquelas que se fica muito restrito à empresa, ao hotel, ao entorno do hotel, e você não acaba conhecendo muito do país. Entre as experiências profissionais e pessoais, já pude visitar por volta de uns 40 países. Delas, as que mais me surpreenderam foram as dos países asiáticos. A Ásia me proporcionou momentos muito ricos em termos de trabalho, de cultura e de belezas. Já fiz umas três ou quatro viagens pra lá, para china, Coreia, Thailândia, Laos. O Vietnam é o lugar que mais tem me encantado e acho que é porque é o que mais se difere de nós latinos e mesmo dos europeus.
BN - O que o Butantan representa para você?
Tiago - Antes de falar do Butantan, acho que a gente tem uma estrutura no Brasil que deve ser valorizada. Essa estrutura é o Sistema Único de Saúde. É um privilégio para poucos países, especialmente aqueles com população acima de 100 milhões. O único nessas condições que tem um sistema de saúde de acesso irrestrito é o Brasil. A gente vê os modelos diferentes disso, de privatização da saúde, que são até cruéis com a sociedade.
Para um profissional da saúde, fazer parte disso, por meio do Butantan, é muito gratificante, especialmente trabalhando numa classe de produtos de medicina preventiva, que são as vacinas. Então, trabalhar na prevenção de uma doença antes que ela aconteça é mais gratificante do que trabalhar com terapias, não que elas não sejam necessárias e importantes. Mas, o mais bacana nisso tudo é você ter um alto impacto de prevenção dentro de uma sociedade complexa, num país complexo como o nosso, onde boa parte se encontra dentro dos trópicos, então, todos os anos vivenciamos desafios diferentes, como a febre amarela, sarampo, dengue, gripe, etc. Esse combo que envolve o SUS, o Butantan, o trabalho com a prevenção de doenças e o alcance que a gente tem à uma grande parcela da população torna esse trabalho gratificante para um profissional da saúde como eu.
(Por Luana Paiva)