O Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) é um distúrbio do neurodesenvolvimento que acomete uma a cada 100 crianças no mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Devido à sua complexidade, com múltiplos graus e manifestações, o transtorno acaba sendo alvo de muita desinformação, sendo o mito mais conhecido o de que vacinas causam autismo. Esta informação é falsa e nasceu de um artigo científico publicado em 1998, já amplamente desmentido pela comunidade científica. À luz do Dia Mundial de Conscientização do Autismo (2/4), conheça a verdade sobre essa história.
O estudo preliminar publicado na revista científica The Lancet pelo médico britânico Andrew Wakefield incluiu 12 crianças que apresentaram sinais de autismo e inflamação intestinal grave, e 11 delas supostamente haviam tomado a vacina tríplice viral (que protege contra sarampo, caxumba e rubéola), pois tinham vestígios do vírus do sarampo no organismo. Utilizando-se de dados falsos e contrariando todos os princípios básicos da pesquisa científica, Wakefield relacionou a manifestação de autismo nas crianças à vacinação. O resultado foi a queda da cobertura vacinal e o surgimento de movimentos antivacina em diferentes partes do mundo, que conquistam adeptos até hoje.
O fato é que não havia vírus do sarampo nas amostras de nenhuma das crianças analisadas e foi descoberto, ainda, que havia um conflito de interesses: o pesquisador tinha encaminhado um pedido de patente para um novo imunizante contra o sarampo, que concorreria com a tríplice viral. Além disso, Wakefield havia sido contratado por advogados para produzir dados contra a vacina, para que eles pudessem ganhar dinheiro processando os fabricantes do produto. A verdade foi revelada em 2004 pelo jornalista investigativo Brian Deer, em reportagem no The Sunday Times.
Em 2010, Wakefield foi julgado como inapto para o exercício da profissão pelo Conselho Geral de Medicina do Reino Unido, que apontou a sua conduta como "irresponsável", "antiética" e "enganosa". Outro médico envolvido na pesquisa, John Walker-Smith, também perdeu a sua licença. Na época, a própria revista The Lancet fez uma retratação e reiterou que as conclusões do estudo eram falsas.
Uma meta-análise publicada na Vaccines em 2014 por pesquisadores australianos investigou diferentes estudos envolvendo mais de 1 milhão de crianças, e os dados mostraram que a vacinação não está relacionada ao TEA. O Comitê Consultivo Global da OMS sobre Segurança de Vacinas (GACVS) também garante que não existem evidências de uma relação causal entre a vacina tríplice viral e o autismo.
As reais causas do TEA são de origem genética – mais de 100 genes já foram associados ao transtorno. Diferentes mutações nestes genes podem desencadear o autismo. Um estudo recente publicado na revista Cell sequenciou os genomas completos de mais de 20 mil pessoas e identificou 134 genes relacionados ao distúrbio.
O autismo é caracterizado por dificuldades de comunicação e interação social e por interesses e comportamentos repetitivos ou estereotipados. A gravidade dessas manifestações varia – daí o nome “espectro” – e as pessoas com autismo podem ser classificadas nos níveis 1, 2 ou 3, dependendo do grau de suporte que necessitam. Por se tratar de um transtorno multifatorial, o diagnóstico é complexo e exige avaliação e acompanhamento de diferentes especialistas, como psicólogos, psiquiatras, neurologistas e pedagogos.